Ophir em conferência da FIA: advogado é essencial à democracia

21/05/2022

Ao discursar ontem (5) na solenidade de abertura da XLVII Conferência da Federação Interamericana de Advogados (FIA), o presidente nacional da OAB, Ophir Cavalcante, destacou o papel do advogado para a consolidação e aperfeiçoamento do processo de muitos países das Américas. “Ao assegurar o direito de defesa e a própria Justiça, o advogado torna-se essencial à própria democracia”, afirmou.


Este ano, a conferência da FIA, que tem sede em Washington (EUA), foi convocada para a Venezuela, país natal do próximo advogado a dirigir a entidade, Rafael Veloz, em substituição ao brasileiro André de Almeida. Em seu pronunciamento, Ophir elogiou os trabalhos desenvolvidos por Almeida, em especial as trocas de conhecimentos que permitiram um maior entrosamento dos advogados dos hemisférios norte e sul.


A Federação Americana de Advogados foi fundada em 16 de maio de 1940 por um grupo de advogados que representam 44 organizações profissionais em 17 nações do Hemisfério Ocidental. A FIA se designa um fórum independente profissional para a troca de informações e de opiniões no interesse do Estado de Direito e das instituições democráticas no Hemisfério Ocidental. A cada ano, a FIA realiza uma conferência internacional em um dos países das Américas durante a qual são realizados seminários especiais sobre questões legais.


Para Ophir Cavalcante, que discursou em torno do tema “Desafios da democracia nas Américas”, ainda que sejam observados avanços sociais nos chamados países emergentes, o abismo entre pobres e ricos ainda é grande, assim como o nível de violência. Segundo ele, cabe às entidades representativas da sociedade civil pôr o dedo nas feridas, quando necessário. “Nossa maior força é a palavra”, afirmou. ”Há vozes, em todo o mundo, a defender uma sociedade mais justa e uma democracia fundada nos princípios dos direitos humanos, de liberdade de expressão e composta por cidadãos livres e iguais. No entanto, nesse universo tem se destacado a voz do advogado por ser ele quem vivencia mais de perto a realidade de seu povo. O advogado está presente naquilo que é mais sagrado nas relações humanas: a Justiça”.


Ao defender as garantias profissionais como essenciais ao trabalho do advogado e ao direito de defesa, Ophir Cavalcante fez uma advertência: “Ninguém espere que a valorização de nossa profissão venha de fora. Ela deve começar em nós mesmos”, disse, acrescentando que limitar o advogado é limitar a própria Justiça, é negá-la em última instância. “O primado da advocacia é a liberdade. Sem ela o advogado se torna refém de todo o sistema ou dos governos, que são transitórios”, concluiu.


Segue o pronunciamento, na íntegra:


Senhoras e Senhores,
Em nome dos advogados e das advogadas do Brasil quero saudar os participantes desta Conferência na figura do nobre presidente André de Almeida, cujo trabalho à frente da Federação Interamericana de Advogados muito nos honra. Vale dizer, nos honra enquanto advogados e como brasileiros comprometidos com o ideal de integração que esta entidade, ao longo de seus 72 anos de história, vem desempenhando magistralmente.


Recordo ainda sua eleição para vice-presidência da entidade, na qual estive presente, ocasião em que foi garantida sua ascensão ao posto que ocupa atualmente. Aqui estou hoje para reconhecer e enaltecer as iniciativas desenvolvidas pela Federação Interamericana no sentido de estreitar as relações e promover mais do que um intercâmbio de idéias entre os advogados das Américas, mas principalmente uma troca de conhecimento entre as diversas realidades que marcam o exercício de nossa profissão.


Ao nobre colega Rafael Veloz, presidente do Conselho Superior Permanente da Federação do Colégio de Advogados da Venezuela, e que em breve assumirá o comanda desta entidade, transmitimos o nosso mais incondicional apoio e votos para que possamos continuar trabalhando juntos.


O abismo social, sobretudo nos países latino-americanos, ainda é profundo, separando pobres de ricos e levando a níveis de violência inaceitáveis.


Há a violência física, prefigurada nas ameaças à integridade de cidadãos, inclusive advogados, como também a violência da condição humana, espelhada na exploração sexual de crianças e adolescente, na mão-de-obra infantil, no trabalho escravo, na degradação dos cárceres, no tratamento desumano aos doentes mentais.


As relações entre os homens pressupõem um ideal comum de todos os povos e de todas as nações, de maneira universal, sem prejuízo da soberania de cada país. Sem nenhum tipo de sujeição a um ou mais poderes do Estado. E sem interferências de qualquer natureza, sejam ideológicas ou econômicas.


Nós, da Ordem dos Advogados do Brasil, estamos convencidos que sem respeito aos direitos, não há sequer sociedade, o que nos leva a refletir sobre a importância do advogado num mundo delimitado por fronteiras políticas e jurídicas muitas vezes conflitantes.


Ao trazer o tema dos “desafios da democracia nas Américas”, esta Conferência nos dá a oportunidade de destacar o papel de entidades como as nossas junto à sociedade, pois nem sempre esse papel é devidamente compreendido, principalmente quando levantamos nossas vozes para denunciar mazelas na administração pública ou quando colocamos o dedo na ferida social.


A palavra, nobres colegas, é a nossa maior arma. Falar — diz Santo Tomás de Aquino — é operação própria da inteligência, que se traduz numa ação transformadora. Palavra puxa palavra, uma ideia traz outra, e assim se faz um livro, um governo ou uma revolução.


Há vozes, em todo o mundo, a defender uma sociedade mais justa e uma democracia fundada nos princípios dos direitos humanos, de liberdade de expressão e composta por cidadãos livres e iguais. No entanto, nesse universo tem se destacado a voz do advogado por ser ele quem vivencia mais de perto a realidade de seu povo. O advogado está presente naquilo que é mais sagrado nas relações humanas: a Justiça.


Com o seu trabalho, o advogado ajuda a construir o edifício da paz social, sem o qual as instituições não perduram. Para exercer sua missão, deve o advogado se revestir de garantias, que no Brasil damos o nome de “prerrogativas profissionais”. Essas garantias têm como objetivo resguardar os direitos dos cidadãos.


Não importa se o cliente é pobre ou rico, influente ou não, todos têm direito à presunção de inocência, ao contraditório, ao devido processo legal. Ninguém pode ser condenado senão mediante sentença transitada em julgado. E o advogado é o elo efetivo entre esses direitos elementares de cidadania e a Justiça.


No Brasil, por preceito da Constituição e definição da lei federal que compõe o nosso Estatuto, o advogado deve ter respeitada, em nome da liberdade de defesa e do sigilo profissional, a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho, de seus arquivos e dados, de sua correspondência e de suas comunicações, inclusive telefônicas ou afins. Não há hierarquia nem subordinação entre advogados, magistrados e membros do Ministério Público, devendo todos tratar-se com consideração e respeito recíprocos.


São diretivas como estas que garantem o Estado democrático de Direito, e delas não podemos recuar nem um milímetro sequer.


Infelizmente, e este é um dado real, seja em que país for, muitos ainda confundem esse tratamento com privilégios corporativos. Confunde-se advogado com o cliente e tenta-se atribuir ao advogado muitas mazelas que no fundo são as próprias mazelas de um Judiciário sem estrutura adequada para atender as demandas da sociedade. O que são as prisões em muitos países da América Latina senão meros depósitos humanos, verdadeiras escolas especializadas em violência e criminalidade?


Um grande jurista de nosso país, Evandro Lins e Silva, já falecido, olhava com tristeza a forma como o governo liberava verbas para construir presídios de segurança máxima. Ele dizia: esse dinheiro seria melhor aplicado em escolas para educar nossa juventude.


Logo, meus caros amigos das Américas, ninguém espere que esta valorização venha de fora. Ela deve começar em nós mesmos. E para que isto aconteça, precisamos não apenas conhecer nossos direitos, como exercitá-los, fazer de cada um deles uma prática diária. E, acima de tudo, devemos exercer nossa profissão com comprometimento ético. Por isto conclamo a todos a lutar por Justiça sempre — é o que importa e o que conta. Justiça rápida, Justiça ágil,


ustiça transparente, Justiça eficiente. Justiça para todos e especialmente para os mais pobres, os mais desamparados, os mais necessitados, os eternamente marginalizados pela sociedade, com os quais a cidadania está em débito. Justiça hoje, justiça agora.


Deve o advogado exercer da forma mais ampla possível o direito de defesa dos interesses a ele confiados, sem temor, e com a segurança de que os atos por ele praticados, no exercício profissional, não receberão e nem podem receber represálias. Sua mente deve ser iluminada pela chama da responsabilidade e pela luz da verdade.


Limitar o advogado é limitar a própria Justiça, é negá-la em última instância. O primado da advocacia é a liberdade. Sem ela o advogado se torna refém de todo o sistema ou dos governos, que são transitórios.


Permitam-me, por fim, lembrar e citar um brasileiro ilustre que de leis e de Justiça foi mais que doutor, foi um mestre, e não por acaso tornou-se o nosso patrono. Rui Barbosa, em 1892, escreveu a seguinte e atualíssima sentença, com a qual encerro minha oração:


“O advogado, na sua nobre missão, não se subordina a nenhum poder humano, a não ser à sua própria consciência e à lei”.


Este é o nosso lema.
Muito obrigado.

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